O muro dos fuzilados
O problema do muro dos fuzilados
é que está em qualquer sítio.
Não se pode dizer: foi aqui,
aqui caiu Pancho, ali González,
mais além, com espuma sangrenta nos lábios,
Enrique gritou "viva a Revolução".
Não se pode dizer esta é a parede,
aqui, estes ladrilhos talvez estejam
salpicados de sangue.
Os fuzilados apostam que não é o momento
de morrer fuzilado.
Um caiu com os olhos abertos,
outro, duro como um tronco:
à força de disparos
só então a história se ilumina.
Só então, por um instante.
Mas esse não é o jogo.
O jogo prossegue, há outros dados,
não revelem a ninguém o muro
dos fuzilados.
Os fuzilados não querem monólitos
nem pedras nem o quadro dos fuzilados.
Os fuzilados queriam que se dissesse "não sei"
se alguém pergunta pelo muro dos fuzilados.
Não sei onde está o muro, não sei, é cedo,
não sei nada de González, ou de Pancho.
(Versão minha. La doble sombra - Poesía argentina contemporánea; selecção de Antonio Tello e José di Marco; Vaso Roto, Madrid, 2014, p. 50).
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