Tráfego pesado
Um pássaro com um caixão na boca.
Um galeão de ouro tripulado por ratos brancos.
Um peixe que quando nada em águas duplas rasga o casco de todos os barcos.
Uma hora na nossa vida que não chegaremos a recordar.
Uma garrafa de uísque vazia com a língua dum náufrago.
Uma palavra que não poderei pronunciar quando me for.
Um vagabundo dormindo debaixo duma ponte.
Um navio cuja tripulação não conhece o mar.
Um erro que voltarás a cometer.
Uma fantasia homossexual que te obceca.
Um verdugo aterrorizado a barbear-se com uma navalha, frente a um espelho.
Uma carruagem de metro onde ela murmura: "Tudo está perdido".
A solidão de um homem que viaja pelas suas veias e se perde antes de chegar.
A obrigação dos relógios andarem para trás para evitar a degolação.
O espaço interior de um caixão e o espaço que o rodeia.
O íman que não atrai sequer a sua sombra.
Uma igreja de cadeiras eléctricas.
O leque fantástico com o qual poderias atrair planetas até à tua janela.
Tudo o que cabe num espaço similar ao triângulo formado pelo ângulo da inclinação
[da Torre de Pisa.
Nunca assassines aqueles que não amas. Negoceia os teus segundos com a eternidade.
(Versão minha. Fonte: Nueva poesía argentina; selecção e introduçãode Leopoldo Castilla; Hiperión, Madrid, 1987, pp. 95-96).
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