sexta-feira, 14 de abril de 2023

Anna Swir

 (Dez poemas)



Depois de um ataque aéreo


Saindo de um monte de destroços
dirigindo-se para o céu
cinzenta como uma parede
uma mão com cinco dedos.



***


Natureza morta


Num charco de lodo e sangue,
entre o corpo meio carbonizado de um cavalo
e o corpo meio carbonizado de um homem,
ao pé de uma conduta de esgoto destruída, um sofá com franjas, uma chaleira
e três pedaços de vidro partido,
jaz o fragmento de uma carta de amor, queimado nas margens:
"Sou tão feliz."



***


Terra e Céu


Havia aqui tantas coisas a gritar
os aviões gritavam e o fogo e a desolação
o ataque gritava
até às nuvens.

Agora a terra e o céu
estão em silêncio.



***


Estou cheia de amor


Estou cheia de amor
como uma grande árvore de vento,
como uma esponja de oceano,
como uma grande vida de sofrimento,
como o tempo de morte.



***


O meu sofrimento


O meu sofrimento
é útil para mim.

Dá-me o privilégio
de escrever sobre o sofrimento de outros.

O meu sofrimento é o lápis
com que escrevo.



***


Não posso


Invejo-te. A qualquer momento
podes deixar-me.

Eu não posso
deixar-me.



***


Protesto


Morrer
é o mais duro
de todos os trabalhos.

Velhos e doentes
deveriam estar isentos dele.



***


Isso não seria nada bom


Quando estou só
tenho medo de me virar
demasiado depressa.

O que está nas minhas costas
pode, no fim de contas, não estar preparado
para assumir uma forma adequada
para olhos humanos.

E isso não seria nada bom.



***


Quatro patas muito gordas


Sinto-me alegre como se fosse
muito gorda.
Como se tivesse quatro
pernas muito gordas. Como se saltasse muito alto
com as minhas quatro pernas muito gordas.
Como se ladrasse
alegremente e muito alto
com essas quatro pernas muito gordas.
Eis quão alegre me sinto hoje.



***


Ansiedade


Fazes entre as árvores
um ninho para o nosso amor.
Mas repara nas flores
que esmagaste.




(Fontes: 1) Talking to my body; tradução de Czeslaw Milosz e Leonarda Nathan, Copper Canyon Press; Washington, 1996; 2) Construyendo la barricada y otros poemas; tradução de Édgar Trevizo; Medusa, Chihuahua, 2021).

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