domingo, 4 de maio de 2008

Al Zolynas

Amor na sala de aulas

- para os meus alunos


De tarde. Do outro lado do jardim, em Green Hall,
alguém começa a tocar no velho piano -
uma peça espontânea, viva e diletante,
cheia de uma melodia alegre e simples.
A música flutua entre nós na sala de aulas.

Estou em frente dos meus alunos
e falo-lhes de fragmentos de frases.
Peço-lhes que descubram os dez fragmentos
do parágrafo vinte e um da página quarenta e cinco.
Eles vieram de todas as partes
do mundo - Irão, Micronésia, África,
Japão, China, até de Los Angeles - e continuam
desejosos de me agradar. Falta menos
de metade do trimestre.

Inclinam-se sobre os livros e começam.
Os lábios de Hamid movem-se enquanto segue
o tortuoso labirinto sintáctico do Inglês.
Yoshie senta-se direita, perfeita com a sua ténue maquilhagem,
as pernas cruzadas, em rápida cadência ritmada
sacudindo o pé direito. Tony,
vindo de um ilha do Pacífico Sul,
espreguiça-se molemente e estende-se sobre a carteira.

A melodia flutua à nossa volta e entre nós,
na sala, quebrada aqui e ali, fragmentada,
recomeçada. Parece oriental, mas
pode ser jazz, ou blues - pode ser
qualquer coisa de qualquer lado.

"Não importa," quero gritar.
"Não se preocupem com fragmentos.
Entendê-los ou não. Tudo
é fragmento e tudo não é fragmento.
Oiçam a música, quão fragmentada,
quão cheia, como não podemos separá-la
do sol a cair de joelhos sobre toda a verdura,
deste movimento, como este momento
contém todos os fragmentos de ontem
e de tudo o que não iremos conhecer do amanhã!"

Em vez disso, mantenho um silêncio cobarde.
A música pára abruptamente;
eles terminam o seu trabalho,
e avançamos munidos das respostas correctas,
que é o mesmo que dizer
que separamos os fragmentos do todo.



(versão minha; original reproduzido em A book of luminous things, organização e introdução de Czeslaw Milosz, Harcourt Brace & Company, San Diego, 1998, pp. 193-194).