O primeiro poema
"Toda a gente tem de ser alguma coisa" -
era o título do meu primeiro poema,
escrito aos sete anos.
O primeiro verso coincidia com esse título,
seguiam-se mais versos empolgados
sobre como toda a gente tem de ser alguma coisa:
"alguém tem de ser médico,
alguém tem de cortar a relva,
alguém tem de escrever poemas"
e outros do mesmo género
dos quais agora já não
me lembro.
O poema acabava com um verso
idêntico ao primeiro:
"Toda a gente tem de fazer alguma coisa".
Enquanto fazia as limpezas, o meu pai
atirou o poema fora, como um bocado de papel
que acumula pó.
Pensei nisto muitas vezes,
por vezes sentindo pena,
até que percebi:
o papel com as palavras do poema
pode ser rasgado, desprezado,
ou atirado ao fogo
que isso não afecta o poema. Ele é
como um ser humano: pode estar perdido,
vaguear por aí, morrer, mas não desaparecerá.
(Versão minha, a partir da tradução inglesa de Biljana D. Obradovic, incluída em Cat painters - An anthology of contemporary serbian poetry; organização de Biljana D. Obradovic e Dubravka Djuric, Diálogos Books, 2016, pp. 233-234).