LumeProvavelmente sou um homem vulgar da classe
média, crente nos direitos individuais, a palavra
"liberdade" é simples para mim, não significa
a liberdade de nenhum grupo em particular.
Politicamente ingénuo, com uma educação
mediana (breves momentos de visão clara
são o seu maior sustento), recordo
o ardente apelo desse lume que abrasa
os lábios da multidão sedenta e queima
livros e incendeia a pele das cidades. Eu costumava
cantar essas canções e sei como é magnífico
caminhar com os outros; mais tarde, a sós,
com o sabor das cinzas na minha boca, ouvi
a voz irónica da mentira e o coro a gritar
e quando toquei a minha cabeça pude sentir
o arqueado crânio do meu país, o seu limite opressivo.
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Um poema velozOuvindo cantos gregorianos
seguia num carro veloz
numa auto-estrada de França.
As árvores precipitavam-se para o passado. As vozes
dos monges cantavam louvores a um deus invisível
(ao amanhecer, tremendo de frio numa capela).
Domine, exaudi orationem meam,
vozes masculinas suplicando calmamente
como se a salvação fosse emergir no jardim.
Para onde ia eu? Para onde ia o sol?
A minha vida estendia-se esfarrapada
pelos dois lados da estrada, frágil como o papel de um mapa.
Na doce companhia dos monges
fiz o meu caminho em direcção às nuvens, ao profundo,
alto, denso azul,
em direcção ao futuro, ao abismo,
engolindo as ásperas lágrimas do granizo.
Longe da manhã. Longe de casa.
No lugar de muros - chapas metálicas.
Em lugar de uma vela - uma fuga.
A viagem em vez da recordação.
Um poema veloz em vez de um hino.
Uma pequena estrela cansada correu
à minha frente
e o asfalto da auto-estrada brilhou,
revelando onde estava a terra,
onde aguardava na expectativa a lâmina do horizonte,
e a aranha negra do anoitecer
e da noite, viúva de tantos sonhos.
(versões minhas, a partir das traduções inglesas do polaco de Renata Gorczynski e Clare Cavanagh, respectivamente, ambas reproduzidas por Edward Hirsch, in Poet's Choice, Harcourt, Orlando, 2006, pp. 104-106.)