segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Tadeusz Ròzewicz

Que sorte...



Que sorte posso apanhar
bagas no bosque
pensei que
não existiam bosques ou bagas.

Que sorte posso deitar-me
na sombra de uma árvore
pensei que as árvores
já não davam sombra.

Que sorte estou contigo
o meu coração bate tanto
pensei que o homem
não tem coração.



****



O sobrevivente



Tenho vinte e quatro anos
levado para a matança
sobrevivi.

Os sinónimos seguintes esvaziaram-se:
homem e fera
amor e ódio
amigo e inimigo
trevas e luz.

O modo de matar homens e animais é o mesmo
eu vi-o:
camiões carregados de homens
que não seriam salvos.

As ideias são apenas palavras:
virtude e crime
verdade e mentiras
beleza e fealdade
coragem e cobardia.

A virtude e o crime pesam o mesmo
eu vi-o:
num homem que era ao mesmo tempo
criminoso e virtuoso.

Procuro um professor e um mestre
possa ele restituir-me a vista a audição a fala
possa ele nomear de novo objectos e ideias
possa separar as trevas da luz.

Tenho vinte e quatro anos
levado para a matança
sobrevivi.



(versões minhas, a partir da tradução para língua inglesa de Adam Czerniawski).

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