Eu podia ter vivdo alegremente
porque para isso tinha aptidão,
tinha a noite serena
e passava horas inteiras sem chorar.
Agora as noites lançam-me um nó corredio
e as minhas artérias apertam-me a garganta.
Se sou amargo, quem me faz amargo?
Vivo a minha vida,
tenho sempre pão e amante
e o vinho nunca escasseia no meu copo.
Já não estou só e abandonado, como os que gesticulam e suam,
os das palmas das mãos feitas de lata,
os que dormem em colchões húmidos.
Quando sigo pelas estradas
e numa taberna -onde se juntam camponeses-
me abeiro do balcão,
não há leis que digam
que para sempre ali devo ficar
ou chegando a manhã
de novo devo tomar a direcção da estrada.
Podia ter vivido alegremente
mas os pássaros aninham as suas crias
nas palmas da minhas mãos
e alguém atou aos meus pés
os caminhos.
Podia ter vivido alegremente
mas agora as casas constroem-se em mim
e retumbam em mim na sua destruição.
Sou de alguma coisa o instrumento,
sinto sempre sobre mim o grande olho ardente
e vou por aqui e por ali, à deriva, embora
pudesse ter vivido alegremente.
(Versão minha a partir da versão castelhana de Yolanda Ulloa reproduzida em Cincuenta poemas de quince poetas húngaros del siglo XX; selecção de András Simor, Izana Editores, Madrid, 2012, pp. 141-142).
2 comentários:
Excelente saber da continuidade...
Obrigado.
Abraço.
Não sei se haverá continuidade, mas obrigado na mesma. Um abraço.
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