Da rua, através da janela, vejo a minha mãe de pé junto ao lava-loiças da cozinha
da casa em chamas, ela mesma em chamas desde há um bom bocado,
não resta muito dela, na verdade só o seu perfil. Passarão trinta anos
e a minha filha verá pela janela
da rua como ardo na casa em chamas. Nem sequer sei
se já saberá então o que está a ver.
Arranjei espaço para a morte na minha vida,
pus de lado o cobertor, a camisa de dormir, a caixa das costelas.
Não teria espaço para nenhum de vós se não tivesse arranjado
espaço para a morte. Enquanto não arranjei espaço para a morte,
para nenhum de vós tinha espaço, não tenham ilusões.
Abro uma noz e encontro as cinzas de um rato,
do meu marido e dos meus filhos, o meu prémio, a minha confirmação.
(Versão minha. Fonte: Luz que fue sombra. Diecisiete poetas polacas (1963-1981); selecção e tradução de Abel Murcia e Gerardo Beltrán, Vaso Roto, madrid, 2021, p. 139).
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