O deserto
(O Diário do Cerco de Beirute, 1982)1
O meu tempo diz-me grosseiramente:
Tu não fazes parte.
Respondo grosseiramente:
Não faço parte,
Procuro compreender-te.
Agora sou uma sombra
Perdida na floresta
De um crânio.
2
Estou de pé, o muro é uma barreira -
A distância encurta-se, uma janela recua.
A luz do dia é fio
Cortado pelos meus pulmões para coser a noite.
3
Tudo o que eu disse sobre a minha vida e a minha morte
Retorna no silêncio
Da pedra debaixo da minha cabeça...
4
Estou cheio de contradições? É verdade.
Agora sou uma planta. Ontem, quando estava entre fogo e água
Era uma colheita.
Agora sou uma rosa e carvão vivo,
Agora sou o sol e a sombra
Não sou um deus.
Estou cheio de contradições? É verdade...
5
A lua usa sempre
Um elmo de pedra
Para combater as suas próprias sombras.
6
A porta da minha casa está fechada.
A escuridão é um cobertor:
Uma lua pálida chega com
Uma mão cheia de luz
As minhas palavras falham
Não traduzem a minha gratidão.
7
A matança mudou a forma da cidade - Esta pedra
É osso
Este fumo respiração de pessoas.
8
Nunca nos encontrámos,
Rejeição e exílio mantêm-nos separados.
As promessas morreram, o espaço morreu,
Morrermos sós tornou-se o nosso ponto de encontro.
(...)
(primeiras oito partes de um poema com trinta e cinco; versão minha, a partir da tradução inglesa de Abdullah al-Udhari, reproduzida em Victims of a Map: a bilingual anthology of arabic poetry, SAQI, London, 2ª edição, 2005, pp. 135-139).
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