segunda-feira, 7 de março de 2011

Charles Simic

O quarto branco



O óbvio é difícil
De provar. Muitos preferem
O que se esconde. Eu preferi-o, também.
Escutei as árvores.

Tinham um segredo
Que se preparavam
Para me revelar -
E não o fizeram.

Veio o verão. Cada árvore
Na minha rua tinha a sua própria
Scherezade. As minhas noites
Eram parte das suas loucas

Histórias. Entrávamos
Em casas escuras,
Sempre em mais casas escuras,
Caladas e abandonadas.

Havia alguém de olhos fechados
Nos andares de cima.
O medo disso, e a maravilha,
Tiravam-me o sono.

A verdade é nua e fria,
Disse a mulher
Que vestia sempre de branco.
Não saía do seu quarto.

O sol indicou uma ou duas
Coisas que tinham sobrevivido
Intactas, à longa noite.
As coisas mais simples,

Díficeis na sua evidência.
Não faziam ruído.
Era o género de dia
A que as pessoas chamavam 'perfeito'.

Deuses disfarçando-se
De ganchos negros de cabelo, um espelho pequeno,
Um pente a que faltava um dente?
Não! Não era isso.

Apenas as coisas tais como eram,
Sem pestanejarem, ali deitadas, mudas
Naquela luz branca -
E as árvores à espera da noite.



(Versão inédita de António Ladeira; o original pode ser lido aqui; há, ainda, um pequeno filme de Noush Anand sobre a primeira estrofe do poema, que se pode ver aqui).

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