sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Jüri Talvet

Surpresas climatéricas




Esperando uma justa recompensa vamos entrando nos anos.
Mais valia apascentarmos ovelhas
e, se chovesse, abrigarmo-nos debaixo de uma árvore frondosa
para escutarmos, como bons cordeiros, em paz e sossego,
as reprimendas de Deus.
Ou ir ao bosque abater árvores de modo a que
o nosso corpo laborioso se adaptasse, a pouco e pouco,
como um machado,
ao ritmo dos golpes no tronco.
Abrir um buraco, pelo menos, na solidão.
Já ninguém escreve ao coronel.
Um farsante sobe à cena e faz girar os olhos
e a poeira é removida. Louvado seja até aos céus.
Mas ao cair da noite todas as partículas dessa poeira
hão-de voltar a cobrir, imóveis, o solo.
Assim, quando de súbito começarem a soprar
ventos mais quentes
apanhar-nos-ão desprevenidos e não saberemos recordar
em que ângulo exacto deveríamos desfraldar
as velas das nossas camisas.




(Versão minha a partir da "versão em língua espanhola do autor e de Albert Lázaro Tinaut" reproduzida em Elegía estonia y otros poemas, Palmart Capitelum, Valência, 2002, p. 33).

2 comentários:

Albert Lázaro-Tinaut disse...

Muchas gracias una vez más, amigo, por haber presentado la poesía de Jüri Talvet a partir de mis versiones al castellano.
Y un saludo cordial.

Lp disse...

Conheci ontem o Jüri pessoalmente (ele veio participar num seminário sobre as literaturas ibéricas que decorreu em Lisboa). Estivemos a conversar alguns minutos num dos bares da faculdade de letras. Foi um prazer muito grande para mim (e também falámos um pouco de si). Um abraço.