quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Kirmen Uribe

O indizível



Não podes dizer Liberdade, não podes dizer Igualdade,
não podes dizer Fraternidade; não o podes dizer.
Não podes dizer árvore ou rio ou coração.
As leis antigas já não se aplicam.

As cheias arrastaram a ponte entre as palavras e as coisas.
Não podes dizer que a decisão de um déspota é um crime.
Não podes dizer que perdeste alguém
se uma memória mundana te perfura a alma.

A linguagem é imperfeita, os signos estão gastos
como velhas mós de moinhos que rodaram e rodaram em demasia. E, por isso,

não podes dizer Amor, não podes dizer Beleza,
não podes dizer Solidariedade; não o podes dizer.
Não podes dizer árvore ou rio ou coração.
As leis antigas já não se aplicam.

Mas, apesar disso, confesso que quando te oiço
dizer "meu amor" fico eléctrico,
seja verdade, ou mentira.



(Versão minha a partir da tradução inglesa de Amaia Gabantxo reproduzida em Six basque poets, selecção e introdução de Mari Jose Olaziregi, Arc, Todmorden, 2007, p. 155).

Sem comentários: