quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Sam Hamill

O poema de Nova Iorque



Sento-me na escuridão, não exactamente
para meditar, nem para esperar pelo amanhecer
que está mesmo a surgir, às seis e vinte e um,
por detrás das árvores na luz cinzenta de Outubro.
Sento-me, respirando, a mente às voltas no seu turbilhão.

Hayden escreve, "Para que serve a poesia
em tempos como estes?" E eu julgo
entendê-lo quando diz, "Um poeta
não pode simplesmente retirar
qualquer sentido de tamanha carnificina."

Porém, no esmagamento do horror,
eu retorno à poesia, não à prosa,
para que me ajude a chegar a um entendimento -
tanto quanto possível - com as mentiras, os assassínios
e as hipocrisisas sufocantes

desses que hão-de liderar uma nação
ou uma igreja. "Para que serve a poesia?"
No dia doze de Setembro
de dois mil e um da Nossa Era
eu sentei-me e li Rumi e beijei o chão.

E agora que milhões morrem à fome
em nome da guerra santa? Qualquer guerra
é santa. Eis a perpétua e patética história
da qual derivamos
em "bíblicas proporções".

Oiço as passadas de Pilatos vibrando
nas lajes, a voz de Joe McCarthy
a praguejar no senado, a "Fat Boy" explodindo
enquanto o céu inteiro estremece.
Na cidade de Nova Iorque os estrondos

e os colapsos subsequentes
originaram ondas sísmicas. Para começar a falar
dos mortos, dos moribundos... como
pode um poeta falar de "proporção" uma vez mais
que seja? No entanto, como disseram os antigos gregos,

"Caminhamos sobre as faces dos mortos."
O escuro céu outonal torna-se azul.
Sozinhos entre cinzas e ossos e ruínas
Tu Fu e Basho escrevem o poema.
O último traço de raiva cega desvanece-se

e uma tristeza muda instala-se,
como pó, para o longo, muito longo caminho. Mas se
eu não me levantar e cantar,
se não me levantar e dançar de novo,
os bárbaros vencerão.

Beijarei, se necessário, a espada que me rouba a vida.




(versão minha; original reproduzido em The Wisdom Anthology of North American Buddhist Poetry, organização de Andrew Schelling, Wisdom Publications, Boston, 2005, pp. 90-91).

1 comentário:

CCF disse...

Desesperar...e resistir.
~CC~